domingo, 16 de outubro de 2011

Conto das Tríades.







De afinar, eu já estava torto e subtonado. Precisava dar continuidade aos meus estudos de violão no qual deixei por incompleto ontem à noite. Durante a noite, no mais silêncio da sala, eu estava perambulando cá com os meus trastejamentos, (falha técnica que se esvairia no suar da prática). O silêncio era tamanho, até que ouvi um semi tom saltitar aos redores da casa. Aquilo passou a me chamar atenção, fiquei atento até um certo tempo... pois o que me interessava mesmo, era a sua outra metade, aquela que o completaria fazendo-o se tornar um tom. Porque de incompleto já bastava o meu juízo e a minha falta de pertencer.
Fui à procura deste outro semi tom, e o primeiro lugar no qual o vasculharia seria no livro das tríades de papai. "Como pode estar um semi tom num livro? A sua moradia é nos braços deste meu violão!" Eu me desafinava a todo jeito como se de nota me fosse feito, notaria mas as voltas das cordas em que se dava na tarracha da mão do instrumento. Além de tudo, fui-me remetido a pensar no maravilhoso violonista Baden Powell, que fazia prelúdios para a vida e choros para o metrônomo, isso provava-se uma disciplina acadêmica em sol para mim, dó eu sentia por não ter ouvido a luz bater atrás do capítulo de exercício do livro sobre as tríades. Ofício, era só refrão. Eu me refrão para o desgaste. Ao dia, era impossível se ouvir o semi tom, tinha luz, a tarde, a TV, e a zoada do fogão ligando à toda panela, coisas que atrapalhavam... Restava-me a ãnsia da noite e a missão de procurar a outra metade do tom.
Brincava correndo paleta em corda no cansaço de resumir serra em grade, quando me bastava... espreguiçava no afrouxar das cordas; a ressonância sonora representava o sino da igreja, pai e mãe levavam a sério. De paletó, luvas, chapéu e gravata, iam na cafeteria conversar sobre cigarros. Eu também me aproveitava do horário só pra ver as portas correrem atrás do mundo.
Em casa volta ao silêncio, pela metade do tom eu procurava, o êxito não me visitava nessas horas. Com o passar dos anos, fui abandonando a esperança de achar aquele som perdido, e passei a me contentar com o semi tom que ouvia-se durante a noite na sala de casa. Lembro-me hoje que, quando perguntava: - Estão todos ouvindo? Todos se intercalavam, e deixavam a minha inércia sonora em estado de rejeição. Talvez, aquilo só servia mesmo para alimentar a minha imaginação quando fosse compor alguma frase rítmica. Não servia muito pra nada, só pra isso.
Até que quando de nota anotei que não notaria mais para a sua má audição, e assim ... o não fiz.
Havia um apreço por enfeitar as cosas.
Minha poesia também era rejeitada, mas aquele semi tom ... bom som inaugurava-se à minha percepção. Jamais, agora então, o recusaria outra vez. É por causa das coisas mesmo, das sub exigências das tocatas...
Meu sorriso por isso, já era orquestra, a sala pela tarde... era jazz. E pela noite... bossa nova. Meus pais... rock total; quanto a minha poesia era sempre sub tonação. Quanto eu... diapasão de passarinhos.


Matheus Carmo

2 comentários:

  1. Matheus ... Suas memórias crônicas me fascinam á cada postagem ... parabéns ... sucesso!

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  2. Meu querido, é sempre assim... Sempre estamos em busca do aperfeiçoamento. No dia em que acharmos que estamos completos, acabou... Não temos mais motivo nenhum pra continuar vivos... O planeta dos seres vivos é um centro de carregamento... Enquanto estivermos aqui, deveremos nos aprimorar... Acabou, chegou ao fim, é hora de partir.

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